quinta-feira, 14 de março de 2013

ANÕES ITALIANOS ADORAM TER SEUS OSSOS QUEBRADOS



A acondroplasia é uma forma de nanismo causada por mutação genética que afeta uma a cada 20 mil pessoas. Na Itália, são cerca de 2.500 pessoas vivendo com acondroplasia. Os anões italianos, ao contrário dos de outras nacionalidades, apreciam particularmente um procedimento cirúrgico chamado alongamento. É um tratamento longo e doloroso que consiste em quebrar os ossos e aplicar um fixador, assim o osso se alonga um terço de uma polegada por dia (cerca de 0,84 cm). Em média, uma pessoa afetada por acondroplasia mede cerca de 1,20 m. Graças ao alongamento cirúrgico dos membros inferiores (cerca de 10 centímetros no fêmur e 10 centímetros na tíbia), essa pessoa pode atingir a altura aproximada de 1,50 m. A melhor idade para começar a fazer as cirurgias é entre 12 e 16 anos. O tratamento dura em torno de três anos.
A ideia de alongar fisicamente um anão me deixou perplexo, então entrei em contato com o Emanuele Satolli, um fotógrafo italiano que tem documentado pessoas com acondroplasia que passam por esse tratamento, para saber um pouco mais.
VICE: Há quanto tempo você trabalha nesse projeto?
Emanuele Satolli: Comecei em janeiro de 2012. Percebi que nunca tinha conhecido ninguém com nanismo em Milão, nas ruas ou nos clubes, então pensei: onde eles estão? Comecei a procurar e conversei com o presidente da AIEAC (Associação de Informação e Estudo da Acondroplasia). Ele me contou que esse procedimento de alongamento era muito popular, o que achei muito interessante. Pesquisei isso mais a fundo e descobri que cerca de 90% dos italianos com acondroplasia passam por essa cirurgia, enquanto no resto da Europa esse número fica na faixa dos 8%.
Existe alguma coisa no estilo de vida na Itália que torna essa cirurgia tão popular?
Bom, era isso o que eu estava imaginando. É um tratamento longo e doloroso, mas também existem questões psicológicas envolvidas. Essas pessoas acham que têm que mudar seus corpos porque eles são errados, ou que precisam se encaixar numa sociedade que não leva as necessidades delas em consideração. É algo muito interessante de se observar. Quando conheci pessoas que estavam passando pelo tratamento, todas estavam muito satisfeitas. Todas sentiam que tinham feito a coisa certa, e que os empregos e o sucesso que tinham agora podiam ser atribuídos, pelo menos parcialmente, à cirurgia. E acho que elas estão certas. Essas pessoas realmente se beneficiaram disso porque agora se sentem mais aceitas pela nossa sociedade. No entanto, em outros países elas poderiam ter sido felizes sem essa cirurgia.
Então na Itália é mais difícil para os anões viver sem essa cirurgia?
Sim, claro. Sem a cirurgia é difícil para eles levar uma vida normal. Que outra explicação pode existir para 90% dos casos de acondroplasia optarem pelo alongamento? Pensando nos Estados Unidos ou em outros países da Europa, a porcentagem é muito menor. Só na Espanha você tem um número comparativamente alto de cirurgias de alongamento, mas ainda assim isso não chega nem perto das taxas da Itália. E quando os pais aqui falam com os médicos sobre isso depois do nascimento de uma criança com acondroplasia, os médicos simplesmente dizem: “Não se preocupem, quando ele ou ela fizer 13 anos, poderá passar pela cirurgia de alongamento e tudo vai ficar bem”. É uma abordagem cultural desde o começo.
Você conheceu alguém que ficou infeliz com a cirurgia? 
Não. Todos estavam satisfeitos. Quer dizer, mesmo coisas diárias básicas, como pegar o metrô, eram complicadas para eles antes — eles não tinham independência. Um dos caras que conheci ainda estava com muita dor algumas semanas depois da cirurgia de fêmur, mas estava feliz. Ele sabia que tinha que passar por mais cirurgias, mas continuava muito ansioso para se tornar independente.
Quanto custa a cirurgia?
Bom, na Itália o governo cobre quase todos os custos da cirurgia. Mas os custos da fisioterapia intensiva ficam com o paciente. Para a cirurgia do fêmur, da tíbia e dos braços, é recomendado um ano de fisioterapia. E os principais centros dessa cirurgia ficam em Milão e Gênova, então as pessoas do sul que têm acondroplasia, por exemplo, precisam viajar com suas famílias e ficar em algum lugar. O custo disso é considerável.
Você planeja acompanhar as pessoas que conheceu?
Sim, espero poder fazer isso. Especialmente com as pessoas mais jovens que conheci, que estavam apenas no começo do tratamento.
Alguém teve alguma reserva em participar dessa história?
Na verdade não, a maioria ficou feliz de se envolver. Muitos me disseram que tinham decidido fazer isso para promover a AIEAC, ou para encorajar o conhecimento dos problemas que eles têm aqui na Itália e construir uma consciência maior sobre a acondroplasia.

Veja mais do trabalho do Emanuele aqui.

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